LIÇÃO DO TEMPO

Corro contra o tempo. Tenho medo que ele me vença. Corro? Parada, sozinha, observo sua passagem pensando em tudo que preciso fazer. Não posso continuar parada, preciso me mover. Quieta, imagino-o cruzando a linha de chegada sem que eu consiga ultrapassá-lo.

- Há tanto para fazer! Tão pouco tempo! Corre!

Não quero correr, quero poder apreciar o dia, acariciar os gatos, sorrir para meu marido. Sem que o tempo me atropele. Sem que eu pense que não fiz o que deveria ter feito. Sem que eu me sinta sua prisioneira.

Já, agora, parei de escrever para ver outras tarefas. A sensação de urgência, o sufoco para realizar tantas coisas já iniciadas, a preocupação em atender novas demandas!

E o tempo me olha, me chama, me espera. Sorrindo, paciente, compassivo, ele me diz:

- Venha, no seu ritmo, há tempo para tudo, não vou cruzar a chegada sem você. Porque se desespera tanto comigo? Nunca te abandonei, você é que, ansiosa, se esquece de mim pensando em tudo ao mesmo tempo. Só na sua cabeça você compete comigo, pois só aí é que você acumula tudo e quer lidar com tudo de uma vez.

- Quando você se concentra, como agora escrevendo este texto, não percebe que eu entro no seu ritmo? Quando fica inteira, presente, em uma só das suas atividades, como neste momento, conversando comigo, transcrevendo nosso diálogo, não sente que eu parei e que não há barreiras entre nós? Que, de fato, eu e você somos um?

- Sei que agora mesmo você pensou que tem de parar para se arrumar senão vai se atrasar e que se fizer isso, talvez não consiga continuar nossa conversa e terminar este texto.

- Sim, há escolhas a fazer. Não posso escolher por você. Mas posso te lembrar, sempre que quiser, que eu estou totalmente disponível, basta que você se faça presente, inteira em cada tarefa, em cada momento, por menor e mais insignificante que seja, pois, como disse Vinicius*, serei eterno enquanto durar.

*Vinicius de Moares - Soneto de Fidelidade